As situações que possibilitam a
expulsão de estrangeiro do território brasileiro encontram-se definidas e
elencadas no artigo 65 da Lei n.º 6.815, de 19/08/2014. Dispõe este artigo o
seguinte:
“É passível de expulsão o estrangeiro
que, de qualquer forma, atentar contra a segurança nacional, a ordem política
ou social, a tranquilidade ou moralidade pública e a economia popular, ou cujo
procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais.
Parágrafo único. É passível,
também, de expulsão o estrangeiro que:
a) praticar fraude a fim de obter
a sua entrada ou permanência no Brasil;
b) havendo entrado no território
nacional com infração à lei, dele não se retirar no prazo que lhe for
determinado para fazê-lo, não sendo aconselhável a deportação;
c) entregar-se à vadiagem ou à
mendicância; ou
d) desrespeitar proibição
especialmente prevista em lei para estrangeiro.”
Paralelamente, o artigo 75 da
mesma Lei estabelece alguns pressupostos negativos à expulsão, ou seja, prevê
situações em que, não obstante a verificação de alguma das causas de expulsão
previstas no artigo 65, a mesma não pode ocorrer. Dispõe este artigo da seguinte
forma:
“Não se procederá à expulsão:
I – se implicar extradição inadmitida
pela lei brasileira; ou
II – quando o estrangeiro tiver:
a) cônjuge brasileiro do qual não
esteja divorciado ou separado, de fato ou de direito, e desde que o casamento
tenha sido celebrado há mais de 5 (cinco) anos; ou
b) filho brasileiro que, comprovadamente,
esteja sob sua guarda e dele dependa economicamente.
§ 1.º Não constituem impedimento
à expulsão a adoção ou o reconhecimento de filho brasileiro supervenientes ao
fato que a motivar.
§ 2.º Verificados o abandono do
filho, o divórcio ou a separação, de fato ou de direito, a expulsão poderá
efetivar-se a qualquer tempo.”
Assim, nos termos do disposto no
citado artigo, constitui, nomeadamente, obstáculo à expulsão de estrangeiro do
território brasileiro a existência de filho do mesmo que comprovadamente esteja
sob a sua guarda e dele dependa economicamente, desde que a adoção ou o
reconhecimento de filho brasileiro não sejam supervenientes ao facto que
motivar a expulsão.
Sucede, contudo, que o regime legal
da expulsão de estrangeiro, sempre que o expulsando tenha filho menor
brasileiro, tem que ser conjugado com as normas e princípios referentes à
criança e ao adolescente, mormente no que concerne ao princípio do melhor
interesse da criança consagrado no artigo 227, caput, da Constituição Federal,
nos seguintes termos:
“É dever da família, da sociedade
e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
Tal regra encontra-se também
inserida no artigo 4.º, caput, da Lei n.º 8.069, de 13/07/90, cujo parágrafo
único densifica a garantia da prioridade da seguinte forma:
“A garantia da prioridade
compreende:
a) primazia de receber proteção e
socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos
serviços públicos ou de relevância pública;
c) preferência na formulação e na
execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de
recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e juventude.”
Por consequência, para o que
agora releva, a decisão de expulsão, cujo processo se encontra regulado nos
artigos 100 a 109 do Decreto n.º 86.715, de 10/12/81, não pode deixar de
considerar um eventual resultado de desprotecção do filho menor do estrangeiro, ainda
que registado após o facto que constitui a causa de expulsão, devendo, como tal, proceder-se a um juízo de prognose relativamente a tal
possibilidade num cenário de ausência do progenitor.
Tem sido esse o entendimento
seguido pelo Superior Tribunal de Justiça, sendo ilustrativa a seguinte ementa,
referente ao acórdão proferido no âmbito do HC289637:
“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL
CIVIL. HABEAS CORPUS. . EXPULSÃO DE ESTRANGEIRO DO TERRITÓRIO NACIONAL.
CONDENAÇÕES CRIMINAIS. FILHA NASCIDA NO BRASIL APÓS A CONDENAÇÃO PENAL E A
EXPEDIÇÃO DO ATO EXPULSÓRIO. ARTIGO 75 DA LEI 6.815/90. CONVIVÊNCIA SÓCIO-AFETIVA
E DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DEMONSTRADAS. OCORRÊNCIA DE HIPÓTESE DE EXCLUSÃO DE
EXPULSABILIDADE. ART. 75, II, DA LEI N. 6.815/80. 1. A jurisprudência do
Superior Tribunal de Justiça flexibilizou a interpretação do art. 65, inciso
II, da Lei 6.815/80, para manter no país o estrangeiro que possui filho
brasileiro, mesmo que nascido posteriormente à condenação penal e ao decreto
expulsório, no afã de tutelar a família, a criança e o adolescente. 2. O
acolhimento desse preceito, todavia, não é absoluto e impõe ao impetrante que
efetivamente comprove, no momento da impetração, a dependência econômica e a
convivência sócio-afetiva com a prole brasileira, a fim de que o melhor
interesse do menor seja atendido. 3. Sob esse ângulo, a prova pré-constituída
nestes autos ostenta a propriedade de evidenciar, de forma contundente, a
convivência sócio-afetiva entre o paciente e a criança e a dependência
econômica desta relativamente àquele. <...> Diante
disso, ao que tudo indica, o paciente, a sua companheira e a criança convivem
juntos sob o mesmo teto e constituem uma família, bem como o paciente contribui
para o sustento da menor e participa da vida escolar dela. Dessarte, ressoa
evidente estar atendido o melhor interesse da criança (best interest of the
child), princípio que o STJ se norteou para conferir temperamentos ao art. 65,
inciso II, da Lei 6.815/80. 4. As provas evidenciam estar o paciente abrigado
pelas excludentes de expulsabilidade, previstas no inciso II do artigo 75 da
Lei n. 6.815/80, razão pela qual a ordem deve ser concedida. Precedentes: HC
157.829/SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 14/9/2010;
e AgRg no HC 115603/DF, Relator Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJ de 18
de setembro de 2009. 5. Ordem concedida.
(STJ, Relator: Ministro BENEDITO
GONÇALVES, Data de Julgamento: 11/06/2014, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO)”
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